Há coisas assim
Acabadinho de chegar de Espanha, depois de uma manhã a debitar construtivismos e coisas afins e de um almoço - que durou praí 4 horas - feito de tapas e (muito) vinho tinto, onde pessoas com mais de quarenta anos discutiam da mesma forma, com os mesmos argumentos, a velha discussão " o que querem os homens/o que querem as mulheres/é assim que se conquistam homens/é assim que se conquistam mulheres/o que é o amor?", da mesma forma, dizia, como eu discutia o mesmissimo tema desde os 16 anos (o que quer dizer que não há solução e que é o tema preferido de toda a gente, independentemente da idade e da nacionalidade), chego à minha sala, acendo um marlboro português - para mim são diferentes dos espanhois, franceses, holandeses e etc - ligo a net para ver o e-mail - nada de especial - e venho até ao blog.
Nos caracois, um desafio da Elentári (desculpa querida, mas vou passar. soa-me a versão bloguista das cartas em cadeia, mas até estou curioso para ver o que o resto da malta escreve), decido ir até ao qmq, só porque tinha alí o link.
Para além da surpresa (boa) de ver o blog activo, um arrepio na espinha, uma certa comoção, uma lagrimazinha no canto do olho ao ler um certo poema de uma certa música de um tal de Jorge Palma. E de repente estou em 1998, em Mira, depois em Coimbra, depois já não sei aonde. E aquela velha discussão, tema preferido de toda a gente, independentemente da idade e da nacionalidade, típico acompanhamento de umas garrafas de vinho tinto, surge com nova clareza: discutimos sempre a mesma coisa, com um fundo, que todos nós vivemos, dificil de definir, tantas vezes transitório, tantas vezes profundo, tantas vezes sentimento fundamental, asfixiante e libertador ao mesmo tempo. Sentimento de que nos podemos lembrar inadvertidamente, que nos surge como actual com uma letra do Jorge Palma, lida num blog de uma amiga e que nos leva a levantar da cadeira, a ir procurar o disco que tem
O meu amor tem lábios de silêncio
e mãos de bailarina
E voa como vento
e braça-me onde a solidão termina
O meu amor tem trinta mil cavalos
a galopar no peito
e sorrisso só dela
quando a seu lado eu me deito
(...)
E aí está porque continuamos a discutir, a teorizar, a tentar encontrar razões onde elas não existem porque o que tentamos compreender não precisa de razões. É.
Porque todos nós, pelo menos uma vez, nos sentimos completos junto de outra pessoa.
Não é a pessoa que nos move, é, tal qual uma droga, este efeito fantástico, paradoxal, de prazer e mal-estar que nos faz andar "enquanto houver estrada pra andar". Alguns dizem que é "amor". Outros terão diferentes palavras. Nada disso interessa. Interessa viver "isso". Interessa, a partir de uma letra que nos leva a uma música, que os leva a um sítio, que nos leva a uma face, que nos leva a um sorriso, que nos leva a um beijo dado no passado, recordar, pensar: A vida é bela porque tem destas coisas.
6 Comments:
O Carlos do Carmo é o Binomio de Newton do Jorge "Venus de Milo" Palma.
Estrela da Tarde
Era a tarde mais longa de todas as tardes que me acontecia
Eu esperava por ti, tu não vinhas, tardavas e eu entardecia
Era tarde, tão tarde, que a boca, tardando-lhe o beijo, mordia
Quando à boca da noite surgiste na tarde tal rosa tardia
Quando nós nos olhámos tardámos no beijo que a boca pedia
E na tarde ficámos unidos ardendo na luz que morria
Em nós dois nessa tarde em que tanto tardaste o sol amanhecia
Era tarde de mais para haver outra noite, para haver outro dia
Meu amor, meu amor
Minha estrela da tarde
Que o luar te amanheça e o meu corpo te guarde
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza
Se tu és a alegria ou se és a tristeza
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza
Foi a noite mais bela de todas as noites que me adormeceram
Dos nocturnos silêncios que à noite de aromas e beijos se encheram
Foi a noite em que os nossos dois corpos cansados não adormeceram
E da estrada mais linda da noite uma festa de fogo fizeram
Foram noites e noites que numa só noite nos aconteceram
Era o dia da noite de todas as noites que nos precederam
Era a noite mais clara daqueles que à noite amando se deram
E entre os braços da noite de tanto se amarem, vivendo morreram
Eu não sei, meu amor, se o que digo é ternura, se é riso, se é pranto
É por ti que adormeço e acordo e acordado recordo no canto
Essa tarde em que tarde surgiste dum triste e profundo recanto
Essa noite em que cedo nasceste despida de mágoa e de espanto
Meu amor, nunca é tarde nem cedo para quem se quer tanto!
Poema de José Carlos Ary dos Santos
Pá.... um dos melhores posts deste blog até à data...
lindo. e quase fiquei a pensar que a tal musa inspiradora tinha aparecido ;)
Sei bem do que falas... Para mim esse é o verdadeiro sentido da vida... Amar e ser amado. Sem como nem porquê. Sem sempre nem nunca. Porque um só momento desse sentimento faz com toda uma vida valha a pena...
Belo post! Belo mesmo.
Obrigada pela visita ao meu humilde blogue. Ainda bem que gostaste do que viste. Eu gostei mesmo foi deste post. Bj
também gostei muito!
simples, rico e certeiro
*clap*clap*
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