sexta-feira, maio 05, 2006

Jean Baptiste Grenouille

Feio, marreco, coxo, assustador. Estes são quatro dos adjectivos que descrevem durante quase todo o livro o personagem principal Jean Baptiste Grenouille. Greouille atrai-me (a mim e a todos os que lêem o livro) não pela sua caracteristica secundária de assassino, mas pela característica principal de ter o nariz mais apurado do mundo. Ele memoriza e organiza os odores que passam por ele, usa-os e em breve procurará aqueles que são raros.
Que inveja! Para quem, como eu, adora explorar a memória olfactiva e ainda precisa usa o nariz para trabalhar, ter esta especial qualidade é pecado puro.
Grenouille usa o nariz para viver as suas emoções. Para explorá-las, para perceber a natureza das pessoas e das coisas com que se cruza. O que cheira mal é venenoso o que cheira bem é delicado. O que tem odores perfumados deve ser explorado, o que tem cheiros sinceros deve ser conquistado. Os cheiros agressivos devem ser evitados e até devem os odores hipócritas ser diluídos. Mas é a ironia dos que devem ser guardados que faz a diferença. Ao ponto de, no livro, o "sapo" os guardar da forma mais terrível possível.
Eu tenho um enorme prazer em guardar memórias através dos cheiros. E desejo ardentemente ter a capacidade de guardar odores para recordar as minhas emoções. Tantas vezes me lembro do beijo, da lingua, do cabelo, dos olhos, das palavras pelo facto do perfume que passa no ar ser o mesmo. Do vaso lá de casa me transportar para o campo de flores na montanha. Das algas do restaurante chinês me transportarem para mergulhos em países do outro lado do mundo... O mais extraordinário é a sala de casa dos amigos nos transportar para os 6 anos e para a festa da escola.
Entrar numa loja e cheirar os perfumes todos não é fácil. O nosso cerebro confunde-se depressa. Muito mais excitante que procurar os perfumes que são limonados, florais, almiscarados, especiarias, pessegados ou florais é encontrar a Rita, a Maria, a Teresa, a Daphne ou até mesmo o Paulo ou o João Pedro. Pelo cheiro do vinho foleiro chegamos às bebedeiras da faculdade, pelo cheiro do suor chegamos ao sexo. Nas comidas a mesma coisa: O Marisco cheira a mar, o anho cheira a leite, o maracujá maduro cheira a chichi de gato!
O nosso nariz tem um poder extraordinário, é uma máquina de que nos esquecemos muitas vezes, tapada pela posição dos olhos que agora fazem tudo por nós. Que pena não explorarmos mais a nossa memória olfactiva que nos faz apertar o coração de lembranças e nos faz, institivamente, tomar decisões das quais dependem a nossa vida.
E no entanto para Grenouille, tudo lá estava arrumado, organizado e tudo tinha cheiro. Tudo! Até aquilo que lhe diziam que não cheirava a nada, cheirava a nada. Mas estava guardado na memória dele como nada. Ele próprio!

3 Comments:

At 12:54 da tarde, maio 05, 2006, Blogger Elentári said...

Adorei "O Perfume". Continuo a achar que dava um belo filme!

 
At 6:54 da tarde, maio 05, 2006, Blogger bonifaceo said...

Embora tenha muito bom olfacto, não o uso assim muito para catalogar as coisas... mas gostei da intensidade com que o post foi escrito.

 
At 5:24 da tarde, maio 11, 2006, Blogger Luna said...

Também adorei o livro. Lembro-me que quando o estava a ler andava com o olfacto muito mais apurado.

 

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