quinta-feira, abril 06, 2006

crónicas de uma rapariga gira, sem namorado # 51

Sempre me pareceu que a forma de atingir a liberdade plena seria através do amor comprometido. Só é livre quem se compromete. Só é livre quem é capaz de dizer “amo-te”. Sempre achei que não seria livre enquanto fugisse do amor. A fuga, seja do que for, implica dependência de outra qualquer coisa. O medo é dependência daquilo com que se evita o confronto, a aceitação da existência disso. Apesar de pensar isto, não encontrava argumentos suficientes para manter a minha tese e, mantinha o meu auto-engano. Por isso, procurei caminhos que pensei conduzirem-me ao estado de liberdade a que aspirava. Para me vir encontrar agora num beco sem saída, excepto o de dar meia volta, voltar para trás e passar por cada encruzilhada em que a escolha foi movida pelo medo. Uma vez li que não se tem uma segunda oportunidade para uma primeira impressão. Passar pelas encruzilhadas não implica mudar o que aconteceu, mas apenas olhar, contemplar e conseguir ver para além, mudando os valores que nos levaram a escolher um caminho em detrimento de outro. Provavelmente os acontecimentos foram apenas os necessários para estar aqui, agora a escrever isto. Ficar presa a eles é só mais uma rasteira para não prosseguir o caminho. É óbvio que em algumas gostava apenas de ter mais uma oportunidade para mudar o que fiz… Mas este desejo deve ser abafado, para que eu não o ouça na maior parte dos meus dias, e ainda mais abafado no silêncio da noite onde as palavras se tornam gigantescas no nosso imaginário.

Tem piada. Quanto mais me parecia que poderia apaixonar-me por alguém, mais asneiras cometia. Até eu sou capaz de perceber que, só alguém com o mesmo medo do amor que eu tenho seria capaz de superar todas as árduas provas e provações que eu propunha. Esses sim, optavam pelos mesmos caminhos que eu e eram também capazes de sugerir novos, igualmente escuros e afastados do que dizíamos querer. Fiz isso, vezes, mais vezes e ainda outras vezes. A maior parte das vezes sem me dar sequer conta das rasteiras que ia passando às possibilidades. Quanto mais real me parecia a possibilidade, pior eram as rasteiras. Algumas dessas rasteiras fazem rir as minhas amigas, de tão ridículas que foram. Outras eram tão bem manipuladas que eu parecia apenas dotada de um azar inato. O que eu me rio cinicamente destas últimas, porque devem existir umas quantas que nem agora sou capaz de as perceber. Devia ser por isso que, me perguntaram a razão de mostrar um lado mais negro do que o real. Achei tão disparatada a pergunta naquela altura.

E tudo isto porquê? Apenas por medo. Medo de deixar de sentir. Medo da rejeição. Medo de não ser capaz de amar. Medo de não ser capaz de ter aquilo que me pode conduzir à liberdade. E o medo prende, faz fugir, manipular para parecer que se tentou, mas que o universo se ergueu e não deixou atingir. E assim, posso ficar em casa a chorar as mágoas de não ter, as mágoas de ter perdido sem nunca ter tido de facto. E assim, parece que fiz a minha parte. Que tentei. E o meu sentimento de obrigação fica assim cumprido.

Não sou a única nestes caminhos. Tenho conhecido várias pessoas que passam rasteiras às suas possibilidades de amarem. Não lhes conheço os motivos, como conheço os meus, mas sei que também elas fogem activamente da possibilidade de amarem. Usam estratégias diferentes das minhas, mas a leitura que fazem é sempre a mesma: o destino não quer que elas sejam felizes. Não sei bem o que se passa com cada uma das pessoas que lê isto. No entanto, se se identificaram um bocadinho apenas, talvez valha a pena perderem tempo a pensar na possibilidade de estarem apenas a passarem rasteiras ao vosso futuro.

15 Comments:

At 10:32 da manhã, abril 06, 2006, Blogger Fabiana said...

Quem sabe...

 
At 10:42 da manhã, abril 06, 2006, Anonymous Anónimo said...

Muito boa esta crónica.

 
At 1:22 da tarde, abril 06, 2006, Blogger Elentári said...

... e por isso ela é gira, sem namorado(?)...
Adorei esta crónica, mexeu um bocado comigo, não quero/posso explicar aqui porquê. De qualquer modo é bom quando as coisas mexem conosco, é sinal que estão bem feitas.

Ah, parabéns, já ultrapassaste as 50 crónicas!

 
At 1:41 da tarde, abril 06, 2006, Blogger salomé said...

Sem querer aprofundar o tema ou estabelecer paralelos com as minhas próprias experiências - que nem todas nós temos a "ousadia" da menina Marina ;)- queria só dizer que gostei muito desta crónica, em especial, pela lucidez com que foi escrita, ou pela lucidez que a levou a ser escrita! Às vezes, a confusão parece o melhor porque nos distancia de alguma coisa em específico e tudo nos parece agradar. E fazemos m esforço “inconsciente” para a manter. Estarão aí as tais rasteiras? Mas a lucidez traz uma serenidade (muitas vezes inquietante, mas não deixa de ser serena) que acaba por se revelar tão ou mais importante.

espero não ter sido muito confusa...

 
At 2:16 da tarde, abril 06, 2006, Anonymous Anónimo said...

porra, esta merda nunca mais acaba?

 
At 6:11 da tarde, abril 06, 2006, Anonymous Anónimo said...

Já dizia o meu avô, quanto mais se pensa nisso, pior é!

 
At 6:12 da tarde, abril 06, 2006, Blogger Nuno Silva said...

se eu não soubesse, dizia que a marina e a salomé parecem psicólogas!!
é muito confuso...

 
At 6:24 da tarde, abril 06, 2006, Blogger Luna said...

Muito bom o post ;)

 
At 6:47 da tarde, abril 06, 2006, Blogger Castromind said...

"É óbvio que em algumas gostava apenas de ter mais uma oportunidade para mudar o que fiz…"
Talvez devesses mudar tudo o que VISTE. Olha com novos olhos. Esquece o Gabriel Garcia Marquez e a rosalina da conceição na sua versão cosmopolita. E olha com os olhos da marina. Já agora... o amor é cego.

 
At 6:56 da tarde, abril 06, 2006, Blogger rps said...

Este post faz-me lembrar a história do tipo que foi a uma conferência de um erudito e, no final, comentou:
- não entendi nada do que ele disse, mas falou muito bem.

 
At 8:14 da tarde, abril 06, 2006, Blogger Pêndulo said...

Tudo se resume a medo da solidão, apenas isso. Mas já devias saber que o amor é enganador, durante um tempo breve, cruelmente breve, não somos só nós, depois voltamos a sê-lo, apenas nós.
Não te iludas Marina, passada a paixão nada tens mais que uma solidão acompanhada.
Sabes, podes acompanhar-te a ti mesma, é só habituares-te à tua pessoa. Custa mas consegue-se.
Ah, mas ilude-te, ilude-te sempre até ao teu fim. Vive esses momentos de engano pois que é deles que a Vida é feita.

 
At 10:46 da tarde, abril 06, 2006, Anonymous Anónimo said...

Primeiro, PARABENS! Segundo, PARABENS! Em primeiro lugar registar que 50 crónicas, é muita crónica...segundo, parece para quem está de fora que estás no caminho certo.
Antes de partilhar convosco o que sinto em relaçao ao post vou começar pelo que sinto em relação aos comentários ao post...é engraçado o quanto os nossos percursos pessoais nos influenciam, tem piada o quão cínicos, doces, ou iludidos nos tornamos em relação ao amor (como se fossem só 3 hipóteses ;-))
Isis, vais-me permitir desmontar um pouco o teu post para poder dar a minha própria opinião.
"Sempre me pareceu que a forma de atingir a liberdade plena seria através do amor comprometido." Quanto a mim a liberdade plena está dentro de nós, se o sonho é esse então só dessa forma vamos atingir a liberdade, mas acho que só existe amor quando partimos dessa liberdade como condição inicial... só ama realmente quem já é livre. Li algures que amar realmente é dar o que não se tem a quem não o quer....talvez um pouco forte! Por outro lado, ainda não estou cínico o suficiente (talvez o meu sonho seja o mesmo que o teu) para achar que só amamos quando estamos iludidos!
"Tem piada. Quanto mais me parecia que poderia apaixonar-me por alguém, mais asneiras cometia. " Lendo esta parte, a pergunta que fica é....qual é o verdadeiro desejo, aceitar que não nos queremos comprometer ou acreditar que é disso que fugimos por medo?
Só uma última....
"E tudo isto porquê? Apenas por medo. Medo de deixar de sentir." Será? Ou medo de começar a sentir?
Todos temos precursos individuais que se cruzam, onde encontrámos diferenças e semelhanças, MAS, a verdade (o que é isso?) é que cada um tem o seu...Mas reflectir, pensar, sentir, isso é que é viver.
Parabéns e segue em frente. Por mim ainda escrevia muito mais...mas....uma razão demasiado terrena impede-me..tenho de ir trabalhar!
Muito boa a crónica.

 
At 11:29 da tarde, abril 06, 2006, Anonymous Anónimo said...

Vão-me permitir de discordar do Pêndulo... essa coisa de que depois da paixão só se tem uma solidão acompanhada é um bocado narcisista! Parece realmente de quem nunca amou. Amar parece-me a mais simbiótica das partilhas e o mais puro estado de alma nos momentos partilhados. Se calhar estou a ser um bocado sonhadora, mas aquilo que vivo permite-me dizer que amar é muito mais do que tudo o que se possa pensar, porque dever ser acima de tudo sentido. Já te disse uma vez, querida AMIGA, que me parece que, em matéria de sentimentos, pensas de mais e depois perdes aquilo que mais te identifica noutras situações que é a espontaneidade. É muito bom sentir, viver, sofrer até por vezes, crescer, partilhar, mudar, ceder, fazer ceder... enfim tudo isto é que caracteriza realmente o amor. Free your mind!!!
Gostei muito da crónica...

 
At 1:58 da manhã, abril 07, 2006, Blogger bonifaceo said...

Vou transcrever uma parte, porque resume muita coisa e porque também me acontece, "E assim, posso ficar em casa a chorar as mágoas de não ter, as mágoas de ter perdido sem nunca ter tido de facto. E assim, parece que fiz a minha parte. Que tentei. E o meu sentimento de obrigação fica assim cumprido." - não é que chore, mas lamento-me, tal como tu da "má sorte" ao amor, da solidão, embora, isso não me faça muita confusão, é algo com que vivo bem, e acho que normalmente não sou eu que ponho os obstáculos para chegar ao amor, embora claro, gajo tímido e tal... cada um é como é....
Muito bom post. Beijos.

 
At 10:18 da manhã, abril 07, 2006, Blogger Ísis Osíris said...

fabiana, muito evasiva!

Elentari, se mexeu contigo, é muito bom sinal ;)

Salomé, parece-me que a associação entre lucidez e serenidade faz sentido…

Rps, tu és “giro” ;) e mais não digo!

Pêndulo: não tenho tanta certeza quanto tu de que isto se resume tudo a uma solidão acompanhada… Pode ser positivo, dependendo da perspectiva com que olhas para a coisa: individualidades que se acompanham!

Cool, quanto á liberdade, o que eu queria de facto dizer é q a prova de que a liberdade existe dentro de nós é através da nossa capacidade de comprometimento (amor em sentido lato)… quanto à 2ª questão que colocas, não sei muito bem qual a resposta… Anda em estudo… ;)

Magnólia, não sei se penso demais e por isso perco a espontaneidade, mas a verdade é que como sabes toda a gente pensa! Talvez fosse outra coisa que me querias dizer e talvez a perceba!

Bonifaceo, ainda bem que não te sentes mal, porque isso é que é importante!! Isso é mais importante do que pensar!

Sensitive, gostei da tua 1ª frase, porque isso é válido para quase todas as coisas: até para o nosso medo da morte!

 

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