sexta-feira, dezembro 08, 2006

O encanto dos fins de tarde e o (en)Canto das sereias

Introdução

Se escolhesse outra época estaria nos anos cinquenta. Num daqueles bailes em que as mulheres graciosas usam roupas sexy's e a música enche a sala com pares a dançarem. Estou a ouvir a banda sonora do filme "2046" e vocês (leitores) poderão dizer que já é um clássico que acompanha os meus dias e as minhas noites.

Com um copo de gin na mesa e um cigarro aceso, pouso o computador em cima das pernas e escrevo. Estava com saudades de pegar na minha alma e levá-la para dentro de um papel sob a forma de palavras. A sala pouco iluminada parece um bar não sei bem em que cidade. De cores quentes para não deixar o meu ser intenso enterrar-se na frieza do tempo, na frieza da saudade. E sempre o vermelho a tentar aquecer-me os sonhos, os dedos, os olhos, enfim a encher-me de todos os vermelhos. Um gato a olhar para os meus dedos. Outro não.

Desenvolvimento

Passam-me muitas imagens pelos olhos. Tenho por costume guardar fotografias do meu amor dentro dos meus olhos. Passam-me todas em forma de filme, animado em câmara lenta. Grandes planos das tuas mãos, desfocagens dos teus olhos de desejo, captação das tuas costas com o rabo nu, paisagens em que estás parado a olhar, a minha mão com um cigarro a acabar enquanto pego numa garrafa, o tapete desarrumado pelos teus pés, o pormenor do teu olho a olhar-me. Algumas imagens têm o teu cheiro. Outras imagens são tão quentes quanto tu. Vejo diante de mim ainda, imagens dos teus pés a afastarem-se. Consigo ouvir o som dos teus dedos a irem-se embora. Desligarem-se de mim. Ouço o teu coração. Ouço o meu coração incrédulo. Ouço-nos ao longe como se fossemos marionetas com vida. As imagens cortadas, esfaqueadas a esvairem-se em sangue. Imagens sem palavras. Não- palavras em sentimentos esvasiadas. Tudo isto habita nos meus olhos, que quer estejam abertos ou fechados veêm sempre. Aos olhos junta-se o som desta ópera que me faz pensar na mão que me acolhe as lágrimas. E as imagens ganham o som. O som do canto das sereias. Todas estas imagens criei-as sob as minhas mãos, com o meu toque do encanto do veludo.

Conclusão

Nem tudo tem de ser como parece. Nem tudo acaba como acaba. Por vezes só acaba para nos deixar começar. Com o som de um vilino a acompanhar o fim. A voz que não se ouve também acaba. As dúvidas não acabam. As interrogações não acabam. A memória distrai-se, mas também não acaba. Acaba apenas o que teve o começo. Umas vezes acaba rápido e perdura por muito tempo. Por vezes dura muito tempo e acaba abruptamente. E quando acaba sobram as imagens. As imagens de noites a sorrir. As imagens de pés cruzados. E quando já tiver passado muito tempo guardam-se no arquivo sob o olho esquerdo. E com este olho criam-se obras. As obras que nascem do que acabou mas sobrou.



Ontem falaram-me de uma palavra que significava "pessoa que tomava más opções de vida", Serão os fins o resultado disso?

1 Comments:

At 12:34 da tarde, dezembro 11, 2006, Blogger Luna said...

Muito bonito o texto...

 

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